segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Noite de Inverno

         Ontem à noite procurei-te por toda a casa e não estavas. Ainda pensei que estivesses a jogar às escondidas comigo. Não seria novo este tipo de jogos entre nós.
        Passei a primeira noite de Inverno com os pés frios e com os braços vazios. Já não estava acostumado a isso.
        Quando te comecei a procurar sorria, e entre sorrisos verbalizava o teu nome Sofia, como se de um garoto eu me tratasse.
        Com o passar do tempo ia perdendo o sorriso e ganhando tremor nervoso na voz. Sentia os meus olhos invadidos por quentes lágrimas. Não faltou muito até que sentisse o seu sal talhar-me as faces.
        Percebi que não estavas. Percebi que não tinhas voltado. Percebi que não ias voltar e que jamais me irias aquecer os pés.

         Percebi então o significado de um funeral

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Conto de Natal

Quando dei conta de mim estava no meio de uma rua concorrida por gente de todos os credos e belezas. Apercebi-me que esta rua pertencia a uma cidade que conhecia bastante bem. Era a minha cidade.
Lembro-me de me ter agasalhado, e agora, que me reapercebi que existo, sinto a razão. Sinto o frio a tecer-me a cara como uma aranha tece uma teia.
Sinto-me mal, enjoado, como se tivesse bebido todo o vinho do mundo num só trago, mas sem perder o equilíbrio.
Sinto os meus olhos em sofrimento por causa do sol forte que se vai levantando.
Entendo então que o dia só agora começa.
Utilizo toda a minha argúcia e percebo uma coisa: é dia 24 de Dezembro.
As gentes, o frio, o raiar do sol tardio a adivinhar a mais longa noite do ano.
Para mim mais parece a Noite das Facas Longas (1).
Não me lembro de mais nada até alguém me atropelar o ombro direito. Cheirei algo conhecido. Era o teu perfume.
Estás longe, mas eu tenho saudades tuas.
E as saudades que sinto de ti apagam-me do mundo e o mundo em mim.
Começo a recordar a tua cara, as tuas covinhas quando sorris e o tremer das tuas pálpebras quando te irritas comigo.
Sorrio, e a minha mente torna-se mais pequena que a roda de um hamster, onde só cabes tu, eu e nós.
De repente, o bafo de um autocarro faz-me acordar.
Não sei onde estou, mas está frio e o sol vai nascendo.

O dia clareava enquanto o frio esquartejava a carne com sede de ti.

(1) - NdA - A Noite das Facas Longas é o epíteto para a decisão do partido nazi assassinar vários dos seus membros, especialmente das SA, na noite de 30 de Junho de 1934