quinta-feira, 24 de março de 2011

S... de oliveira

Encostado estava ele, Pedro. Oliveira era o seu encosto. Uma oliveira velhinha, dobrada sobre o peso do tempo que passou ao sol, à chuva, ao frio e ao calor. Poucos se encostavam a ela, mas muitos a vararam em tempos, quando ela era nova, vigorosa, fértil.
Era assim que Pedro imaginava o seu encosto. Amava-a como quem ama o seu corpo. A oliveira era parte de si. As suas costas tinham cada casca prestes a soltar-se marcada.
Eles eram uma só pessoa, uma só vida, feitas de muitas vidas passadas.
Agora, Pedro, perto dos 30 anos, barba aparada e franja rodada ao vento, a barriga a salientar-se por debaixo de uma formosa camisola, tocava ao de leve a oliveira, parte do seu ser, e sorria. Virou-se para a ver enquanto a sentia, e recordou cada uma dos momentos passados até aí. Poderia ter chorado, mas em vez disso sorriu, porque sabia que esta era a altura.
Soergueu-se e com o sol a brilhar-lhe os olhos e a aragem a abanar os ramos soprou um estridente assobio. A este som a porta do seu carro parado à distância obedeceu, e abriu-se.
Saiu de lá uma figura uma figura feminina. Pedro voltou costas ao vulto que se aproximava e sussurrou a um buraco oco e escuro da oliveira: "É ela, é ela a S..."

"só se pode vencer a natureza obedecendo-lhe" - Francis Bacon

http://www.youtube.com/watch?v=yQoOohOsyyE

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